Página | 431
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
http://periodicos.utfpr.edu.br/actio
O delineamento de tarefas matemáticas à
luz da pesquisa de desenvolvimento: uma
oportunidade de reflexão para a prática
pedagógica
RESUMO
Cleiton Antonio Marino
cleitonmarino@gmail.com
orcid.org/0000-0002-3789-666X
Universidade Tecnológica Federal do
Paraná (UTFPR), Londrina, Paraná, Brasil
Marcele Tavares Mendes
marceletavares@utfpr.edu.br
orcid.org /0000-0001-6844-6525
Universidade Tecnológica Federal do
Paraná (UTFPR), Londrina, Paraná, Brasil
O presente trabalho é recorte de uma pesquisa de mestrado em andamento, que visa
analisar o processo de elaboração de uma trajetória de ensino e de aprendizagem
envolvida no contexto de plantas baixas para alunos do ano do Ensino Fundamental.
Toda reflexão fundamenta-se nos princípios da abordagem de ensino Educação Matemática
Realística que: reconhece a matemática como uma atividade humana, propõe um contexto
de sala de aula em que o aluno se reconhece protagonista e responsável por seu processo
de aprendizagem e, o professor como um guia que orienta e acompanha seus alunos, por
meio de intervenções, na direção dos objetivos da educação desejada. De modo específico,
neste trabalho, o objetivo é apresentar uma reflexão construída a partir de um ciclo
iterativo de aplicação e refinamento de uma das tarefas que compõem o primeiro design
da trajetória de ensino e de aprendizagem, na direção de apresentar e discutir aspectos de
sua aplicação, análise, avaliação e reformulação para novo design e novo ciclo iterativo.
Trata-se de um estudo de natureza qualitativa de cunho interpretativo em que o processo
de sua elaboração baseia-se na Pesquisa de Desenvolvimento (Design Research). A fase de
aplicação do primeiro ciclo iterativo ocorreu com um grupo de oito alunos do ano do
Ensino Fundamental em uma escola estadual do Paraná, no segundo semestre de 2017.
Pudemos inferir que para um professor vivenciar e analisar o processo de evolução e
delineamento de enunciados de tarefas matemáticas possibilita uma reflexão e
aprimoramento de sua prática pedagógica, assim como explorar contextos em tarefas de
matemática em aulas desenvolvidas à luz dos princípios da Educação Matemática Realística
faz-se uma alternativa para superar uma abordagem de ensino de matemática
convencional.
PALAVRAS-CHAVE: Educação Matemática Realística. Trajetória de ensino e aprendizagem.
Tarefas matemáticas. Pesquisa de Desenvolvimento.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
INTRODUÇÃO
Na busca por caminhos que possam contribuir para o processo de ensino e
aprendizagem, educadores matemáticos e pesquisadores vêm desenvolvendo
estudos e estratégias focadas na interação do aluno com situações cotidianas. Uma
característica dessas estratégias é o aluno ser protagonista de seu processo de
aprendizado, que ainda precisa ser apropriadamente inserido nos contextos da
sala de aula. É preciso, assim, que se abra mão das orientações mais tradicionais
de ensino para que outras ganhem espaço e possibilitem esse protagonismo
(SARAIVA; PONTE, 2003; MARIN, 2012; WEININGER, 2001; FARIA, 2004).
Nesta perspectiva, o uso de propostas didáticas por meio de tarefas que
estimulem os alunos a desencadearem processos de organização e
reconhecimento da necessidade de instrumentos matemáticos e de sua
manipulação correta. Nessa direção, as tarefas que os alunos desenvolvem em sala
de aula ou em casa, aliadas a uma abordagem de ensino coerente, precisam ser
selecionadas ou elaboradas de um modo que possuam potencial para que os
alunos explorem possibilidades, desenvolvam estratégias de resolução, analisem a
relação do contexto da tarefa com a matemática e até mesmo redescubram a
própria Matemática (FREUDENTHAL, 1973; VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010;
SMITH; STEIN, 1998).
No presente trabalho, apresentamos resultados parciais de uma pesquisa de
mestrado em andamento que, com base na abordagem de ensino Educação
Matemática Realística (RME
1
), visa elaborar um produto educacional
2
composto
por tarefas matemáticas que em comum referem-se às plantas baixas de casas e
da própria sala de aula que serão compiladas em uma trajetória de ensino e de
aprendizagem
3
para alunos do 6º ano do Ensino Fundamental que vai ao encontro
de um currículo que integra conteúdos de domínios matemáticos distintos. Neste
artigo, especificamente, temos como objetivo investigar que aspectos influenciam
um professor ao delinear, aplicar e revisar uma tarefa que compõe uma trajetória
de ensino e de aprendizagem para o ano do Ensino Fundamental à luz da
Educação Matemática Realística?
Com isso, subsidiamos nossas reflexões na análise de um ciclo de iteração de
aplicação de uma tarefa (tarefa 5) do primeiro desenho da trajetória de ensino e
de aprendizagem. Ela foi aplicada a um grupo de 8 alunos do ano do Ensino
Fundamental de uma escola estadual do Paraná na cidade de Londrina no segundo
semestre de 2017. O processo metodológico desse ciclo de iteração baseia-se na
abordagem de Pesquisa em Desenvolvimento (Design Research).
Para tanto, apresentamos uma discussão dos resultados e as inferências
realizadas acerca da questão da investigação, tomando como ponto de partida a
apresentação e a discussão do processo de construção desse produto educacional
à luz da Pesquisa de Desenvolvimento por meio da proposição da abordagem de
ensino escolhida e seus princípios. Em seções próprias expomos aspectos dos
procedimentos metodológicos da Pesquisa em Desenvolvimento e os
reconhecemos no estudo. Em seguida apresentamos e discutimos o delineamento
de uma tarefa da trajetória de ensino e de aprendizagem para seu estado atual.
Finalizamos com as nossas considerações finais, seguidas das referências
bibliográficas.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
A ABORDAGEM DE ENSINO EDUCAÇÃO MATEMÁTICA REALÍSTICA
A Educação Matemática Realística (RME) foi selecionada como a abordagem
de ensino para o desenvolvimento da pesquisa por ter os papéis do professor e do
aluno em um ambiente de sala de aula distintos dos convencionais
4
. Os alunos
constroem uma matemática a partir do lidar com tarefas em um contexto
realizável ou imaginável. Por intermédio dessas tarefas, ocorre o processo de
matematização, que é a organização de uma realidade por meio da matemática
(DE LANGE, 1987). O professor, por sua vez, planeja e coordena todo esse
processo, providencia e disponibiliza os materiais necessários, auxilia e instiga o
aluno com orientações e questionamentos. O professor guia e acompanha o
processo de aprendizagem de cada aluno.
Segundo Gravemeijer (2005):
[...] o professor continua a ser a autoridade na sala de aula, mas de uma forma
diferente, ele passa a definir as regras do que é a Matemática e o que significa
aprender Matemática na sua sala de aula. Além disso, o professor escolhe as
atividades de ensino, escolhe tópicos para discussão, e orquestra as
discussões em grupo turma, de tal forma que estas contribuam para a
Matemática que se pretende ensinar. Ao fazê-lo, têm de descobrir um
equilíbrio entre o “guiar” e o “re(inventar)”. Resumidamente, é o professor
que molda a inovação curricular que está aqui implícita (GRAVEMEIJER, 2005,
p. 22).
Um dos pressupostos dessa abordagem de ensino é a matemática como
atividade humana. Esse pressuposto tem reflexo direto no ensino da matemática,
uma vez que revela a essência da matemática que o aluno deve vivenciar em sala
de aula. Conforme descrevem Ferreira e Buriasco (2016):
[...] a essência da Educação Matemática não reside no ensino dos objetos
matemáticos simplesmente, mas sim na atividade: um processo de
organização e tratamento de um assunto por meio desses objetos. Sendo a
matemática vista como uma ação, não faz sentido ensiná-la como uma
sucessão de conteúdos “prontos para o consumo” sem dar aos alunos
diferentes oportunidades para experienciar a matemática como uma
“atividade humana” Nesse sentido, os conteúdos, conceitos, objetos, ideias,
algoritmos, propriedades matemáticas emergem dos fenômenos com os
quais os alunos podem se envolver ao lidar com um assunto, em vez de ser o
ponto de partida (FERREIRA, BURIASCO, 2016, p. 243).
As situações pelas quais podem emergir a matemática sistematizada na
perspectiva da Educação Matemática Realística são os contextos concretos ou
imagináveis pelos alunos, que doravante será denominado neste texto por
contexto realístico, que podem contribuir para que ocorra o processo de
matematização.
A reinvenção guiada é a estratégia de ensino inerente à RME (GRAVEMEIJER,
2005). O processo de matematização dos alunos envolvidos em uma reinvenção
guiada ocorre a partir do lidar com uma tarefa. Nessa estratégia, é determinante
o conjunto de orientações e questionamentos do professor durante o processo de
ensino e aprendizagem. Desse modo, o professor guia o processo de
matematização, orientando-os a utilizar seus próprios conhecimentos para,
posteriormente, chegarem aos procedimentos formais, podendo tornar possível
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
que o aluno sistematize conhecimentos matemáticos construídos historicamente
(FREUDENTHAL, 1991).
O professor guia com o intuito de acompanhar o aluno em suas produções, a
fim de elaborar intervenções para que o próprio aluno construa seu conhecimento
a partir do lidar com a matemática como uma ferramenta (MENDES, 2014).
Em sua dissertação, Silva (2015) fez uma revisão bibliográfica de diversos
estudos publicados a respeito da Educação Matemática Realística, para apresentar
uma configuração da reinvenção guiada. Um dos aspectos destacado por ele é o
fato de domínios do conhecimento matemático serem considerados entrelaçados.
Esse aspecto se refere a um dos princípios da RME: o princípio do entrelaçamento.
O princípio do entrelaçamento significa que os domínios do conhecimento
matemático como número, geometria, medidas, e tratamento da informação
não são considerados como capítulos isolados no currículo, mas como
fortemente integrados (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010b, p. 5).
Além do entrelaçamento, Van Den Heuvel-Paunhuizen (2010) apresenta
outros cinco princípios da Educação Matemática Realística: da atividade, que se
refere à matemática como atividade humana; da realidade, pois o processo de
matematização ocorre a partir de um contexto realístico; de níveis, em que os
alunos perpassam por distintos níveis de compreensão, partindo dos processos
informais até que, de modo progressivo, atinjam os modelos mais formais; da
interatividade, pois se a matemática é uma atividade humana, ela também se
por meio da socialização; de orientação, pois o uso da estratégia de ensino
reinvenção guiada direciona o aluno à oportunidade de descobrir a matemática.
Valendo-nos de reflexões acerca desses princípios da RME, consideramos
pertinente elaborar uma trajetória de ensino e aprendizagem para que, ao
explorarem um contexto realístico, os alunos tenham a oportunidade de
sistematizar conhecimentos geométricos, numéricos, de medidas e de tratamento
da informação apoiados no material didático.
Entre as inúmeras possibilidades de contextos a serem explorados em tarefas
para promover a aprendizagem matemática, escolhemos os elementos que
compõem a casa do aluno e a própria sala de aula, representados em uma planta
baixa. Elaborar, reproduzir e rascunhar plantas baixas é uma prática que pode
desenvolver importantes habilidades no contexto escolar, como o
desenvolvimento da percepção espacial, a capacidade de conversão de medidas
para o uso adequado de escalas dos projetos e o estudo de adição e multiplicação
de números decimais para o cálculo do perímetro e da área de cada cômodo
representado.
A produção de materiais, pelo professor, como uma trajetória de ensino e
aprendizagem, que contém tarefas e reflexões das mesmas, elaborada a partir de
um contexto realístico, pode ser suporte adequado para que os alunos
desenvolvam o processo de matematização com a utilização da reinvenção guiada.
É nesse momento de planejamento que o professor prevê como irá conduzir as
tarefas, de modo que favoreça a aprendizagem.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
A ABORDAGEM METODOLÓGICA E OS PASSOS PERCORRIDOS
O processo de elaboração das tarefas que integrarão a trajetória de ensino e
aprendizagem vem ocorrendo a partir de uma pesquisa qualitativa de cunho
interpretativo, à luz da Pesquisa de Desenvolvimento, conhecida
internacionalmente como Design Research, Design-based Research ou
Development Research.
De maneira geral, podemos dizer que uma “pesquisa de desenvolvimento”
refere-se àquelas investigações que envolvem delineamento, como a
elaboração do artefato em sua primeira versão, sendo que o
desenvolvimento refere-se ao processo contínuo de seu refinamento por
meio da avaliação sistemática (BARBOSA; OLIVEIRA, 2015, p. 527).
No contexto da educação, essa abordagem de pesquisa pode ser desenvolvida
com intenção de elaborar produtos educacionais. O estudo se inicia com a
definição do problema, com uma consulta entre os sujeitos envolvidos; passa pela
formulação da questão de pesquisa; e ocorre o estudo do contexto e a literatura.
Em um segundo momento, ocorre o desenvolvimento do produto, embasado
em uma construção teórica, visando apresentar uma solução para o problema
definido. Posteriormente, o produto deverá ser testado, ou seja, aplicado no
contexto definido.
Após a implementação, os pesquisadores observam quais são as modificações
necessárias, a fim de aprimorar o produto por meio de análises, avaliações e
validações; as alterações são realizadas e novamente ocorre a utilização do
produto com o público-alvo (MATTA; SILVA; BOAVENTURA, 2014). Esse ciclo pode
ser repetido várias vezes com a finalidade de refinar cada vez mais o produto,
conforme observamos na Figura 1:
Figura 1: Ciclo de aplicação, análise, avaliação e validação da DBR
5
.
Fonte: Matta, Silva e Boaventura (2014).
A implementação da intervenção com os participantes, a coleta de
informações e sua análise na Fase 3, como descrevemos anteriormente, pode se
repetir quantas vezes forem necessárias, considerando o tempo disponível para
pesquisa, com a finalidade de refinar o produto educacional. Esse é o principal
motivo que nos levou a escolher essa metodologia, entre outras vantagens que ela
proporciona. Eerde (2013), pesquisadora do Instituto Freudenthal na Holanda,
pontua as vantagens de utilizar essa abordagem metodológica nas pesquisas em
Educação Matemática.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Modela problemas que promovem o pensamento e o aprendizado
do aluno;
Elabora hipóteses sobre o ganho de conhecimento do estudante;
Conjectura sobre seus próprios papéis como professores a
promover e guiar o aprendizado dos alunos;
Faz questões abertas e de acompanhamento;
Observa de perto o que os estudantes fazem e dizem;
Analisa e interpreta o que os estudantes fazem e dizem;
Remodela problemas e suposições sobre o aprendizado dos alunos
baseada nos dados (EERDE, 2013, p. 9, tradução nossa).
Exposto os aspectos da abordagem metodológica do trabalho em andamento,
prosseguimos para o detalhamento dos passos do estudo. No Quadro 1
apresentamos um resumo do caminho metodológico seguido à luz da Pesquisa
Desenvolvimento.
Quadro 1 Caminho Metodológico da Pesquisa em Andamento de Acordo com as Fases
da Pesquisa DBR
Fase da pesquisa
Tópicos
Passos metodológicos da pesquisa
em andamento
Fase 1: Análise do
problema por
investigadores,
usuários e/ou
demais sujeitos
envolvidos em
colaboração.
Definição do problema.
Discussão entre os autores sobre a
práxis docente do orientando.
Consulta recíproca entre
sujeitos engajados na
práxis e investigadores.
Apresentação e aprovação da
problematização com os pares no
contexto escolar.
Questões de pesquisa.
Que aspectos influenciam um
professor ao delinear, aplicar e
revisar uma trajetória de ensino e
de aprendizagem para o 6º ano do
Ensino Fundamental à luz da
Educação Matemática Realística, e
como os contextos nela envolvidos
favorecem um entrelaçamento dos
conteúdos?
Contextualização e/ou
revisão de literatura.
Definição da abordagem da RME
para o produto educacional e
revisão da literatura
correspondente.
Fase 2:
Desenvolvimento da
proposta de solução
responsiva aos
princípios de design,
às técnicas de
inovação e à
colaboração de
todos os envolvidos.
Construção Teórica.
Estudo de textos científicos sobre a
abordagem RME.
Desenvolvimento de
projeto de princípio para
orientação do plano de
intervenção.
Desenvolvimento da trajetória de
ensino e aprendizagem durante o
curso de especialização.
Descrição da proposta de
intervenção.
Conclusão da proposta didática, sem
processo de implementação com
alunos.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Fase da pesquisa
Tópicos
Passos metodológicos da pesquisa
em andamento
Fase 3: Ciclos
iterativos de
aplicação e
refinamento em
práxis da solução.
Implementação da
intervenção (primeira
iteração)
Escola que o primeiro autor trabalha
como professor.
Participantes.
Oito alunos de 6º ano do Ensino
Fundamental em turmas que o
pesquisador não atua como
professor.
Coleta de informações.
Produção escrita do aluno, diário do
professor e gravação de áudio dos
diálogos entre os sujeitos.
Análise das informações.
Análise da produção escrita.
Implementação da
intervenção
(segunda iteração)
Nova iteração após reformulação do
produto educacional na mesma
instituição.
Participantes.
Uma turma de 6º ano do Ensino
Fundamental de 30 alunos na qual o
pesquisador atua como professor.
Coleta de informações.
Produção escrita do aluno, diário do
professor e gravação de áudio dos
diálogos entre os sujeitos.
Análise das informações.
Análise da produção escrita.
Implementação da
intervenção
(terceira iteração)
Última iteração após reformulação
do produto educacional na mesma
instituição.
Participantes.
Uma turma de 6º ano do Ensino
Fundamental de 30 alunos na qual o
pesquisador atua como professor.
Coleta de informações.
Produção escrita do aluno, diário do
professor e gravação de áudio dos
diálogos entre os sujeitos.
Análise das informações.
Análise da produção escrita.
Fase 4: Reflexão
para produzir
“Princípios de
Design” e melhorar
implementação da
situação.
Princípios de design.
Artefato(s)
implementado(s).
Desenvolvimento
profissional.
Professores e investigadores
obterão uma nova concepção do
produto educacional após o
processo de refinamento.
Fonte: adaptado de Matta, Silva e Boaventura (2014).
A proposta de problematização emergiu da práxis docente do primeiro autor
que atua cinco anos em turmas do ano de Ensino Fundamental, em
discussões com sua orientadora (segunda autora), na qual reconheceram uma
possibilidade de integração curricular entre os conteúdos de conversões de
medidas no sistema métrico, área e perímetro, noção intuitiva de escala e
operações com números decimais. Integração que vem ao encontro do princípio
do entrelaçamento da RME. Esse reconhecimento foi discutido e compartilhado
em seu contexto escolar, houve uma aprovação da problematização com os
professores e com a equipe pedagógica da instituição de ensino em que o primeiro
autor trabalha.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Assim, estabelecemos a seguinte questão de pesquisa: Que aspectos
influenciam um professor ao delinear, aplicar e revisar uma trajetória de ensino e
de aprendizagem para o ano do Ensino Fundamental à luz da Educação
Matemática Realística, e como os contextos nela envolvidos favorecem um
entrelaçamento dos conteúdos?
Para responder essa questão, o objetivo geral da pesquisa em andamento é
desenvolver um produto educacional que serve ao processo de ensino e de
aprendizagem, analisando o processo de evolução e delineamento dos enunciados
das tarefas que o compõem.
A leitura de artigos, livros, dissertações e teses que versam sobre a abordagem
de ensino Educação Matemática Realística (VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, 2010;
DE LANGE, 1987; GRAVEMEIJER, 2005; FERREIRA, 2013; SILVA, 2015; SANTOS,
2014) serviram de suporte teórico para elaboração do primeiro desenho da
trajetória de ensino e de aprendizagem uma proposta didática que foi
desenvolvida pelo primeiro autor, em um trabalho de conclusão de um curso de
especialização
6
, orientado pela segunda autora. Nessa proposta, ainda sem
processo de implementação com alunos, foi realizada uma descrição de
intervenções possíveis (Fase 2 do caminho metodológico Quadro 1).
O contexto selecionado originou-se do hobby da infância e adolescência do
primeiro autor, que passava suas tardes esboçando plantas baixas. Essa prática
contribuiu para o desenvolvimento de várias habilidades, como a conversão de
medidas do sistema métrico para o uso adequado da escala e a multiplicação e
adição de números decimais para o cálculo de área e perímetro dos cômodos e de
suas representações no projeto. Assim, pode também servir de ponto de partida
para que os alunos aprendam a lidar matematicamente com a representação de
sua casa ou da sala de aula.
O Quadro 2 apresenta uma descrição sintetizada de cada uma das 14 tarefas
presentes no primeiro desenho da trajetória de ensino e de aprendizagem
(produto educacional em construção).
Quadro 2 Design 1 da trajetória de ensino e aprendizagem
Tarefa
Nome
Descrição sintetizada da tarefa
1
Desenhe sua casa
Desenhar a forma como é dada a divisão dos
cômodos da casa, como se estivesse vendo
de cima, sem o telhado, sem tomar as
medidas.
2
Pesquisa
Pesquisa do conceito de planta baixa.
3
Trocando ideias
Interação entre dois alunos para descrever as
diferenças de plantas baixas de duas casas.
4
Planta baixa da sala de aula
Em grupo, tomar as medidas da sala de aula
das paredes, janelas e porta da sala de aula e
esboçar a planta baixa da mesma.
5
Momento de reflexão
Reflexão sobre cada passo da tarefa anterior.
6
Pesquisa
Pesquisa do conceito de escala. E interação
com um colega sobre a pesquisa
7
Faça em casa
Esboço da planta baixa do quarto do aluno.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Tarefa
Nome
Descrição sintetizada da tarefa
8
Observação da tarefa do
colega
Interação entre dois alunos para verificar se
foi respeitado o conceito de escala na planta
baixa.
9
Área e Perímetro do seu
quarto
Cálculo da área e do perímetro do quarto do
aluno, mesmo que as medidas forem com
números decimais.
10
A cozinha
Esboço da planta baixa com o uso adequado
da escala e cálculo de área e perímetro.
11
A casa do colega
Cálculo da área e do perímetro da cozinha ou
do quarto da casa que o professor solicitar.
12
A planta baixa da sua casa
Refazer a tarefa 1.
13
Comparação entre as plantas
baixas
Elaborar uma redação, comparando as
plantas baixas esboçadas nas tarefas 1 e 12.
14
A casa dos sonhos
Criar a planta baixa da casa dos seus sonhos.
Fonte: autoria própria (2017).
O primeiro ciclo iterativo de aplicação (Fase 3 do Quadro 1) foi realizado no
segundo semestre de 2017 com um grupo de 8 alunos do 6º ano do Ensino
Fundamental de uma escola estadual do Paraná na cidade de Londrina. A formação
do grupo de alunos se deu por um convite pelos professores das turmas de 6º ano
(turmas em que o pesquisador não é professor regente) para participarem de uma
atividade em período contraturno de seus estudos regulares, sendo que 8 alunos
aceitaram o convite. O desenvolvimento da trajetória de ensino e de aprendizagem
foi em quatro encontros de uma hora e trinta minutos cada.
Os dados coletados para análise a partir da aplicação do lidar dos alunos com
cada uma das 14 tarefas são o registro no diário do professor, na produção escrita
dos alunos e nos arquivos de áudios gravados. Os alunos, pais e direção da escola
assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido para utilização e
divulgação dos dados.
Para o primeiro semestre de 2018 estão previstos outros dois ciclos de
aplicações, conforme especificado no Quadro 2, seguindo o encaminhamento
metodológico representado na Figura 1. Nesse texto, especificamente, vamos
analisar a evolução, delineamento da quinta tarefa do Quadro 3, de seu estado
antes da aplicação até o seu desenho para o segundo ciclo de aplicação uma
reconfiguração.
UM OLHAR PARA A TAREFA 5 - REFINAMENTO NA PRÁXIS
As tarefas da trajetória de ensino e de aprendizagem possuem uma ligação
umas com as outras. Em particular, a quinta tarefa está relacionada com a tarefa
anterior apresentada no Quadro 3 - que propõe aos alunos que façam o desenho
da planta baixa da sala de aula. Para isso, foi necessário disponibilizar instrumentos
de medidas como trena e fita métrica a fim de os alunos tomarem as medidas das
paredes e esboçarem a planta baixa.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Quadro 3 - primeira versão da tarefa 4
Planta Baixa da Sala de Aula:
Reúnam-se em grupos de 04 alunos, meçam os comprimentos das paredes e façam o
desenho da planta baixa da sala de aula.
Fonte: autoria própria (2017).
A tarefa 5 enunciada no Quadro 4 em sua primeira versão foi elaborada
em formato de questionário. Por meio dela, esperou-se que os alunos
individualmente observassem e expressassem a necessidade de padronização de
escala de medidas entre o ambiente representado (sala de aula) e o desenho da
planta baixa
7
construído na tarefa 4 em grupo, com o intuito de oportunizar aos
estudantes que conhecimentos matemáticos, como conversão de medidas e ideias
intuitivas de proporcionalidade, fossem desenvolvidos.
Quadro 4 - primeira versão da tarefa 5
Momento de Reflexão:
A tarefa a seguir deverá ser realizada individualmente.
a) Como o seu grupo mediu o comprimento de cada uma das paredes?
b) Qual é a medida do comprimento da parede na qual o quadro negro está localizado?
c) Na planta baixa da sala de aula que você acabou de desenhar, qual é a medida do
comprimento da linha desenhada que representa a parede do quadro negro?
d) Um centímetro da linha desenhada na planta baixa da parede em que se localiza a
lousa representa quantos centímetros da parede real?
e) Um centímetro da linha desenhada na planta baixa da parede em que se localiza a
lousa representa quantos metros da parede real?
f) Qual é a medida do comprimento das paredes ao lado da parede na qual se localiza o
quadro?
g) Na planta baixa da sala de aula que você acabou de desenhar, qual é a medida do
comprimento da linha que representa as paredes do lado da parede na qual o quadro
está localizado?
h) Um centímetro da linha desenhada na planta baixa das paredes ao lado da parede em
que se localiza o quadro representa quantos centímetros destas paredes reais?
i) Um centímetro da linha desenhada na planta baixa das paredes ao lado da parede em
que se localiza o quadro representa quantos metros destas paredes reais?
j) Um centímetro nas paredes correspondentes ao quadro negro e às paredes do lado do
quadro, correspondem à mesma medida da parede?
k) Comente o motivo da sua resposta no item “j”.
l) Agora que você refletiu, refaça a planta baixa da sua sala de aula.
m) Essa planta baixa tem alguma(s) alteração(ões) em relação à desenhada na tarefa
anterior? Qual ou quais?
Fonte: autoria própria (2017).
As possibilidades de resposta do item “a” dessa questão se referem à
descrição de como a primeira parte da tarefa anterior foi desenvolvida. As
respostas dos itens “b” e “f” dependem das medidas da sala de aula em que os
alunos estudam, bem como os itens “c” e g”, pois as respostas dependem das
medidas dessas paredes nas representações das plantas baixas. Nos itens d” e
“h”, por sua vez, o aluno precisará dividir a medida da parede pela medida da
representação da parede no esboço da planta baixa. Para isso, é necessário que
ambas estejam na mesma medida (centímetros ou metros). As respostas desses
itens dependem das medidas dessas paredes empregadas na representação da
planta baixa.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Nos itens “e” e “i”, o aluno pode realizar a conversão de medidas de
centímetro para metro em relação aos itens “d” e “h” ou refazer o cálculo dividindo
a medida da parede (em metros) pela medida da mesma parede na planta baixa
(em centímetros), pois a resposta depende da medida dessa parede na
representação da mesma. Assim, os alunos que ainda não souberem converter
metros em centímetros, terão a oportunidade de lidar com relações entre
medidas.
A intencionalidade pedagógica do item “j” é levar o aluno a refletir se a escala
adotada nas paredes de medida distintas é a mesma. No item seguinte, é solicitada
uma justificativa dessa resposta, com o objetivo de que o aluno perceba a
necessidade de os dois pares de paredes paralelas serem representados por meio
da mesma escala.
Treffers e Goffree (1985) mencionam que os contextos das tarefas podem
desempenhar na formação dos estudantes algumas funções: formação de
conceito; modelo de formação; aplicabilidade; exercício de habilidades específicas
em situações aplicadas. A partir das intencionalidades mencionadas da tarefa 5,
reconhecemos que o contexto planta baixa pode servir para que os estudantes
tenham um acesso natural para a formação de conceitos da matemática, sendo
possível: ser suporte para a aprendizagem de operações e procedimentos formais
(escalas, por exemplo) em conjunto com as outras tarefas; servir como suporte
para a compreensão de conceitos matemáticos; reconhecer a realidade como
fonte e domínio para desenvolver habilidades.
Ao elaborar a tarefa, os autores buscaram interpretar a situação de ensino
com base no conhecimento do contexto planta baixa. Buscou-se resolver
antecipadamente de um modo detalhado e colocar-se no lugar do aluno para
compreender os possíveis erros e resoluções que poderiam apresentar. Conforme
Van den Heuvel-Panhuizen (2000), sem manter uma perspectiva da trajetória de
ensino e de aprendizagem com vistas ao que se deseja, não é possível orientar a
aprendizagem dos estudantes. Complementamos, mesmo mantendo essa
perspectiva, é preciso reavaliá-la e reconstruí-la a cada passo dos processos de
ensino e de aprendizagem.
Essa necessidade de reflexão sobre a prática e em especial as tarefas utilizadas
em contexto de sala de aula é evidenciada no primeiro encontro da primeira
aplicação da trajetória de ensino e de aprendizagem. Por uma questão de escolhas
e de estrutura textual, iremos focar nossa discussão na aplicação da tarefa 5. Essa
tarefa foi aplicada no segundo encontro, resolvida pelos oito alunos participantes.
O número de questionamentos da tarefa, apesar de grande, tinha por
intenção ser um guia de reflexão”, para que, por meio deles, os estudantes
explicassem suas estratégias e resolução da tarefa. Entretanto, ao aplicá-la, houve
muitos questionamentos por parte dos estudantes, pois, para eles, as questões
não estavam tão claras, eles tiveram dificuldades em identificar qual parede se
referia cada item da questão. Além disso, a quantidade de questões os
desmotivou, a interpretação das perguntas não ocorreu de modo imediato.
Nesta direção, reconhecemos que para além de elaborar boas” questões
(tarefas) é preciso que elas favoreçam boas intervenções orais e escritas, pois por
meio das intervenções será possível flexibilizar e oportunizar que os alunos
apresentem seu poder matemático, bem como “abrir a possibilidade de realizar
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
uma reinvenção guiada, com o qual o aluno pode iniciar um processo de
matematização, seguindo seu próprio percurso de aprendizagem” (MENDES, 2014,
p. 204).
No momento da aplicação, para superar tais dificuldades o professor decidiu
ler junto com os alunos as questões que apresentaram dúvidas e, quando
necessário, apontou para a parede que a pergunta se referia.
Mesmo com as dificuldades mencionadas, todos os alunos participantes, ao
refazer a planta baixa da sala de aula no item “l” dessa questão, utilizaram um
centímetro da planta baixa para representar as mesmas medidas nas quatro
paredes, ou seja, fizeram uso intuitivo do conceito de escala. A Figura 2 e a Figura
3 são exemplos da evolução das plantas construídas por um aluno na tarefa 4 e no
item “I” da tarefa 5, respectivamente:
Figura 2 Produção do Aluno A, antes dos questionamentos da tarefa 5.
Fonte: arquivo próprio (2017).
Figura 3 Produção do Aluno A, após os questionamentos da tarefa 5
Fonte: arquivo próprio (2017).
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Apesar das medidas das paredes da sala de aula serem próximas nos dois
registros, na primeira representação (Figura 2) existe uma diferença entre o
comprimento e a largura. na segunda (Figura 3), as proporções dos lados com
as referidas medidas foram respeitadas.
Ao refazer a planta da sala e após as reflexões promovidas por vários itens
desse questionário, cuja intenção foi intervir no processo de construção do
conhecimento, os alunos perceberam a necessidade da utilização de um
parâmetro de medidas entre o desenho da planta baixa e o ambiente
representado, sem a necessidade de nominar esse conceito de escala, uma vez que
a sistematização desse conceito se deu nas tarefas sequentes da trajetória.
O princípio dos níveis destacou-se nessa tarefa. Após a compreensão de cada
item do questionamento, os alunos perceberam a necessidade de um centímetro
na planta baixa representar a mesma medida em cada uma das paredes da sala de
aula. Dessa forma, o próprio aluno desenvolveu o conhecimento por meio de uma
situação baseada na tarefa desenvolvida, o que possibilita a evolução para um nível
de conhecimento mais elaborado. Além disso, todos alunos tiveram a
oportunidade de produzir conhecimentos. As reflexões possibilitaram que o aluno
desenvolvesse um conceito intuitivo de escala por meio da abordagem da RME.
Um aspecto importante desta abordagem é que cria oportunidades para os
alunos desenvolverem o conhecimento matemático fundamentado em
experiências do dia a dia. Mais importante ainda, deixa em aberto a conexão
com essas fontes. Isto, por sua vez, permite aos alunos evoluírem para níveis
de compreensão mais concretos, se eles resolverem problemas. Por isso, esta
abordagem deixa espaço para os alunos trabalharem a diferentes níveis
(GRAVEMEIJER, 2005, p.15).
Após vivenciar a primeira aplicação, analisar e avaliar os dados coletados,
iniciamos o processo de validação das tarefas da trajetória. Especificamente com
relação a tarefa 5, foi possível avaliar que as intencionalidades pedagógicas das
perguntas presentes no questionário foram adequadas, entretanto, foi preciso
reconfigurar o design da tarefa para que alunos de 6º ano do Ensino Fundamental
ao resolverem não tenham dificuldades em interpretar o texto. Os
questionamentos podem estar no planejamento do professor, como
questionamentos potenciais para orientar os alunos no desenvolvimento da
tarefa, favorecendo uma maneira de reinvenção guiada.
Em seu novo design, decidimos utilizar os desenhos das paredes a localização
dos alunos:
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Quadro 4 - segunda versão da tarefa 5
Considerando que sua carteira esteja posicionada como no desenho, escreva as
medidas reais e as medidas que você utilizou no desenho da planta baixa:
a) Calcule e preencha quantos centímetros na parede real correspondem um centímetro
na planta baixa nas paredes:
Parede 01 (Quadro): ___________
Parede 02: _______
Parede 03: _______
Parede 04: _______
b) As medidas preenchidas no item “a”são iguais? Em sua opinião, elas deveriam ser
iguais? Por quê?
c) Após as reflexões para respostas os itens “a”, e ”b” desta tarefa, refaça a planta baixa
da sua sala de aula.
d) Foi feito algo diferente da primeira versão da planta baixa da sala de aula para essa?
Explique.
Fonte: autoria própria (2017).
Espera-se que na primeira parte dessa nova versão da tarefa 5, o aluno
preencha as medidas utilizadas no desenho da planta baixa da tarefa anterior e as
medidas reais das paredes que foram representadas. Essa nova “forma” tem a
intenção de proporcionar ao aluno uma visualização dos dados necessários para
responder os itens dessa questão, assim como melhorar a comunicação entre
professor e aluno, uma vez que na primeira versão da tarefa os alunos tiveram
dificuldade de interpretar e lidar com os seus itens.
O item “a” requer que o aluno compare os dados que coletou na primeira
parte da tarefa e apresente a medida que 1 centímetro da planta baixa representa
em cada uma das quatro paredes da sala de aula. O aluno precisa perceber que
essa resposta somente será obtida corretamente se efetuar a divisão da medida
real da parede com a medida dessa mesma parede representada na planta baixa.
A intencionalidade do item seguinte, “b”, é proporcionar uma reflexão acerca
da necessidade de padronização das medidas que um centímetro deve representar
em qualquer planta baixa. Essa reflexão se a partir da comparação entre as
medidas que um centímetro representou na planta baixa desenhada na tarefa 4.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
Ao refazer a planta baixa no item “c”, espera-se que o aluno utilize os
conhecimentos refletidos nos itens a” e “b”. Desse modo, caso o aluno não tenha
padronizado as medidas que um centímetro representa em cada parede na tarefa
4, a expectativa é que represente-as fazendo uso intuitivo do conceito de escala
que será sistematizado posteriormente.
Ao responder o item “d”, o aluno deverá comparar as duas versões de
desenho e verificar as diferenças. Espera-se que os alunos expressem
intuitivamente elementos que provoquem uma discussão acerca do uso de escala,
assim como problemas em representações que não obedecem de sua utilização.
Esses elementos nortearam discussões do professor com toda a turma.
Cabe salientarmos que essa tarefa, assim como as demais, passaram por um
processo de refinamento fechando o primeiro ciclo de aplicação. Iniciamos um
novo ciclo de aplicação e, durante esse procedimento - análises, avaliações e
validações - as tarefas pertencentes à trajetória de ensino e aprendizagem poderão
passar por alterações e, até mesmo, serem substituídas ou excluídas.
A compreensão da necessidade do uso intuitivo de escala a partir da atividade
informal de medir uma planta baixa revela a obtenção do objetivo inicial da tarefa
pelos oito participantes, evidenciando o princípio de níveis da RME. Esse é um
aspecto determinante para validação e manutenção dessa tarefa para a segunda
versão da trajetória de ensino e de aprendizagem, contudo, as diversas dúvidas
que os alunos apresentaram neste processo expressam a necessidade de
reconfiguração do enunciado da tarefa.
Desse modo, a apreciação do modo de lidar dos alunos com a tarefa, os
resultados em suas produções e o reconhecimento do princípio de níveis no
desenvolvimento da tarefa foram aspectos relevantes que influenciaram o
processo de análise, avaliação, validação e reformulação da tarefa 5.
Todo esse processo de análise, avaliação e validação são momentos em que
possibilitam uma reflexão e aprimoramento da prática pedagógica, para além da
criação de uma trajetória de ensino e de aprendizagem desejada. Assim como
explorar contextos em tarefas de matemática em aulas desenvolvidas à luz dos
princípios da Educação Matemática Realística faz-se uma alternativa para superar
uma abordagem de ensino de matemática convencional.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES: POSSIBILIDADES ACERCA DA PESQUISA
Entre os aspectos que influenciaram o redesenho do enunciado da Tarefa 5,
destaca-se a análise do modo de lidar de alunos e a percepção do docente acerca
das dificuldades de alunos durante a realização da tarefa. Esse redesenho tem a
intenção primeira de evitar que ocorram as mesmas dúvidas acerca do enunciado
da tarefa. Esse processo evidencia como a prática pedagógica precisa ser um
processo de constante reflexão e planejamento.
Um objetivo subjacente desse trabalho residiu em provocar um repensar o
ensino de matemática por meio de desenvolver, aplicar, analisar e avaliar a
evolução de uma tarefa matemática à luz da Educação Matemática Realística.
Nessa direção, a elaboração de produtos educacionais para a utilização no
contexto escolar (assim como discussão de tarefas matemáticas), aliada às atitudes
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
pedagógicas adequadas à Educação Matemática Realística é um caminho a ser
explorado em discussões em momentos de formação com professores de nosso
país.
Os princípios da abordagem de ensino Educação Matemática Realística estão
fortemente presentes na proposta didática em desenvolvimento. O princípio do
entrelaçamento com a integração de conteúdos de domínio matemáticos
distintos, o princípio de níveis é identificado na tarefa 5, por exemplo, pois a
mesma parte da atividade informal das medidas de um esboço de planta baixa para
a compreensão da necessidade da utilização do conceito de escala, com o
desenvolvimento da ideia intuitiva de proporcionalidade. O contexto selecionado
favorece a identificação do princípio da realidade. A interatividade é reconhecida
nas tarefas desenvolvidas em grupo, como a tarefa 4. O princípio da orientação
ocorre pela utilização da estratégia de ensino reinvenção guiada e o princípio da
atividade pode ser observado em tarefas não rotineiras propostas ao aluno no
desenvolvimento de atividades humanas para emergir os conhecimentos
matemáticos.
O processo de delineamento refinará, ainda mais, a proposta didática a
trajetória de ensino e de aprendizagem. Possivelmente ocorrerão exclusões de
algumas tarefas, acréscimo de outras, alterações de enunciados,
desmembramento de uma tarefa em duas ou mais, aglutinação de duas ou mais
tarefas em uma, revisão da forma como será conduzida e dos objetivos com cada
uma. “Olhar” para todo esse processo (ou parte dele, como é o caso desse
trabalho) pode subsidiar professores a superar uma abordagem convencional de
ensino. Não temos intenção de propor a utilização do material em
desenvolvimento como o único recurso utilizado para o trabalho pedagógico dos
conhecimentos matemáticos explorados, mas como uma alternativa curricular que
integra os conteúdos matemáticos a partir de uma situação real, assim como
inspirar o nascimento de outras trajetórias de ensino e de aprendizagem.
Reconhecendo na elaboração delas uma oportunidade de momentos de formação.
A versão final da trajetória de ensino e aprendizagem será acompanhada de
um guia, a fim de orientar professores que venham a fazer uso do produto
educacional em desenvolvimento. Esse material contemplará direcionamentos de
como conduzir o processo de ensino e aprendizagem com a abordagem Educação
Matemática Realística em cada uma das tarefas.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
The delimitation of mathematical tasks in
the light of the design research: an
opportunity of reflection of the pedagogical
practice
ABSTRACT
The present work is a review of an ongoing master's degree research, which aims to analyze
the process of elaborating a teaching and learning trajectory - involved in the context of low
plants - for students of the 6th year of Elementary School. All reflection is based on the
principles of the teaching approach Realistic Mathematical Education that: recognizes
mathematics as a human activity, proposes a classroom context in which the student
recognizes himself as the protagonist and responsible for his / her learning process and, the
teacher as a guide that guides and accompanies its students, through interventions, toward
the goals of the desired education. Specifically, in this work, the objective is to present a
reflection constructed from an iterative cycle of application and refinement of one of the
tasks that make up the first design of the teaching and learning trajectory, in order to
present and discuss aspects of its application, analysis, evaluation and reformulation for
new design and new iterative cycle. It is a qualitative study of an interpretive nature in which
the process of its elaboration is based on the Research of Development (Design Research).
The phase of application of the first iterative cycle occurred with a group of eight students
from the 6th year of elementary school in a state school in Paraná, in the second half of
2017. We could infer that for a teacher to experience and analyze the process of evolution
and delineation of enunciates of mathematical tasks makes possible a reflection and
improvement of its pedagogical practice, as well as exploring contexts in mathematical tasks
in classes developed in the light of the principles of Realistic Mathematical Education, it
becomes an alternative to surpass a approach of teaching of conventional mathematics.
KEYWORDS: Realistic Mathematics Education. Trajectory of teaching and learning.
Mathematical tasks. Design Research.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
AGRADECIMENTOS
1
Do inglês Realistic Mathematics Education.
2
Esse produto educacional está em desenvolvimento pelo primeiro autor, sob a
orientação da segunda, durante seus estudos de pós-graduação em um Programa
de Mestrado Profissional em Ensino de Matemática.
3
Conforme Van den Heuvel-Panhuizen (2002), uma trajetória de ensino e de
aprendizagem tem três propósitos entrelaçados: uma trajetória de aprendizagem,
uma visão geral dos processos de aprendizagem dos estudantes; uma trajetória de
ensino com indicações didáticas que descrevem um ensino que articula e estimula
a aprendizagem e um esboço do assunto do currículo de matemática a ser
ensinado.
4
Consideraremos convencionais os papéis em que o professor é o detentor do
conhecimento e esse deve repassá-lo para seus alunos, geralmente por meio de
aulas expositivas, e os alunos, como receptores, devem reproduzir os conteúdos
estudados.
5
Os autores do referido artigo consideraram o nome em inglês Design-Based
Research (DBR).
6
Especialização em Educação Matemática e Ensino de Ciências da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná, Campus Londrina.
7
Apesar de os alunos estarem em grupo, cada aluno fez o seu registro em seu
material.
REFERÊNCIAS
ALENCAR BARBOSA, J. C.; OLIVEIRA, A. M. P. Por que a pesquisa de
desenvolvimento na Educação Matemática? Perspectivas da Educação
Matemática, v. 8, n. 18, 2015.
DE LANGE, J. Mathematics, Insight and Meaning. Utrecht: OW & OC, 1987.
VAN EERDE, H. A. A. Design research: Looking into the heart of mathematics
education. In: Proceeding The First South East Asia Design/Development
Research (SEA - DR) International Conference, 2013, Sriwijaya University. Anais…
Palembang: UNSRI, 2013, p. 1-10.
FARIA, E. T.O professor e as novas tecnologias. Ser professor, v. 5, p. 57-72, 2004.
FERREIRA, P. E. A. Enunciados de Tarefas de Matemática: um estudo sob a
perspectiva da Educação Matemática Realística. 2013. 121f. Tese (Programa de
Pós Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática) Universidade
Estadual de Londrina, Londrina, 2013.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
FERREIRA, P. E. A.; DE BURIASCO, R. L. C. Educação matemática realística: uma
abordagem para os processos de ensino e de aprendizagem - Educação
Matemática Pesquisa, v. 18, n. 1, 2016.
GRAVEMEIJER, K.P.E. O que torna a Matemática tão difícil e o que podemos fazer
para alterar. Educação matemática: caminhos e encruzilhadas. Lisboa: APM, p.
83-101, 2005.
MATTA, A. E. R.; DA SILVA, F. P. S.; BOAVENTURA, E. M. Design-based research ou
pesquisa de desenvolvimento: metodologia para pesquisa metodologia para
pesquisa de desenvolvimento: metodologia para pesquisa aplicada de inovação
em educação do século xxi. Revista da FAEEBA - Educação e
Contemporaneidade, v. 23, n. 42, 2014.
MENDES, M. T. Utilização da Prova em Fases como recurso para regulação da
aprendizagem em aulas de cálculo. 2014. 275f. Trabalho Tese de doutorado
(Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática)
Universidade Estadual de Londrina, 2014.
SARAIVA, M.; PONTE, J. P. O trabalho colaborativo e o desenvolvimento
profissional do professor de Matemática. Quadrante, p. 25-52, 2003.
SANTOS, E. R. Análise da produção escrita em matemática: de estratégia de
avaliação a estratégia de ensino. 2014. Tese (Doutorado em Ensino de Ciências e
Educação Matemática) Universidade Estadual de Londrina, Londrina. 2014.
SILVA, G. S. Uma configuração da reinvenção guiada. 2015. 94f. Dissertação
(Mestrado em Ensino de Ciências e Educação Matemática) Universidade
Estadual de Londrina, Londrina, 2015.
TREFFERS, A.; GOFFREE, F. Rational analysis of realistic mathematics education.
In: ISSN 1980-4415 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1980-4415v29n52a02
Bolema, Rio Claro (SP), v. 29, n. 52, p. 452-472, ago. 2015 472 STREEFLAND, L.
(Ed.). Proceedings of the 9th International Conference for the Psychology of
Mathematics Education. Utrecht, The Netherlands: OW&OC. 1985. p. 97-123.
VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, M. V. D. Mathematics education in the
Netherlands: A guided tour. Freudenthal Institute Cd-rom for ICME9. Utrecht:
Utrecht University, 2000. CD-ROM.
VAN DEN HEUVEL-PANHUIZEN, M. V. D. Reform under attack Forty Years of
Working on Better Mathematics Education thrown on the Scrapheap? No Way!
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 431-450, set./dez. 2018.
In: The Annual Conference of the Mathematics Education Research Group of
Australasia, 2010, Australia, p. 3-7.
WEININGER, M. J. Do aquário em direção ao mar aberto: Mudanças no papel do
professor e do aluno. In: LEFFA, Vilson J.. (Org.). O Professor de Línguas
Estrangeiras: construindo a profissão. Pelotas: Editora da Universidade Católica
de Pelotas, 2001, p. 41-68.
Recebido: 27 fev. 2018
Aprovado: 04 jun. 2018
DOI: 10.3895/actio.v3n3.7945
Como citar:
MARINO, C. A.; MENDES, M. T. O delineamento de tarefas matemáticas à luz da pesquisa de
desenvolvimento: uma oportunidade de reflexão para a prática pedagógica. ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p.
431-450, set./dez. 2018. Disponível em: <https://periodicos.utfpr.edu.br/actio>. Acesso em: XXX
Correspondência:
Cleiton Antonio Marino
Estr. dos Pioneiros, n. 3131 - Jardim Morumbi, Londrina, Paraná, Brasil.
Direito autoral: Este artigo está licenciado sob os termos da Licença Creative Commons-Atribuição 4.0
Internacional.