ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 3, p. 6-25, set./dez. 2018.
princípio de incerteza de Heisenberg, que reconhece certa indeterminação, ou
seja, a impossibilidade de precisão na mecânica quântica.
Surge nesse cenário a necessidade de reavaliar o conceito de ciência, que
passa a ser o objeto de estudo da epistemologia.
Essa denominação começou a ser utilizada em meados do século XIX,
correspondendo à teoria do conhecimento. Com maior precisão, e tendo em
vista a intensificação das discussões contemporâneas em torno da ciência, o
termo “epistemologia” passou a ser usado para designar o estudo do
conhecimento científico do ponto de vista crítico, isto é, do seu valor.
(ARANHA; MARTINS, 2009, p. 382).
De acordo com Tesser (1995, p. 92), a palavra epistemologia remete ao
discurso sobre a ciência, ou seja, “o estudo crítico dos princípios, das hipóteses e
dos resultados das diversas ciências”. Nesse sentido, é papel do epistemólogo
conhecer e analisar o processo de construção do conhecimento científico, do
ponto de vista social, lógico, político e histórico. Assim, deve-se considerar que a
ciência constrói um conhecimento que não é imutável, mas sim provisório.
Podemos destacar alguns epistemólogos que através de seus estudos
trouxeram grandes contribuições para as discussões acerca do processo de
construção do conhecimento científico: Karl Popper, Gaston Bachelard, Paul
Feyerabend, Ludwik Fleck, Thomas Kuhn, entre outros. Devido à importância da
obra do epistemólogo Ludwik Fleck para a visão histórico-filosófica da Ciência,
apresentamos a seguir algumas de suas ideias contidas em seu livro Gênese e
desenvolvimento de um fato científico.
A EPISTEMOLOGIA DE LUDWIK FLECK
Em seu livro, o médico polonês Ludwik Fleck apresenta uma interpretação do
processo de construção do conhecimento científico, em contrapartida à visão
empírico-indutivista. De acordo com Massoni e Moreira (2015, p. 238) “Fleck opôs-
se, como Karl Popper e outros filósofos do séc. XX, às ideias positivistas do Círculo
de Viena, baseadas no empirismo tradicional, no indutivismo e no verificacionismo
como forma de demarcar o discurso científico do não científico”. Nesse sentido,
Fleck disserta sobre a noção de construção coletiva Ciência, ou seja, considera as
relações estabelecidas entre a comunidade científica para o desenvolvimento de
um conceito, destacando que essa construção não ocorre de maneira individual.
Uma característica presente na obra deste epistemólogo é o reconhecimento
da importância da História para a construção do conhecimento. De acordo com
Fleck (2010), não se chega a um conceito sem uma abordagem histórica, ou seja,
é imprescindível considerar o passado e o contexto histórico, detectando o
impacto de fatores externos na construção da ciência. Nesse sentido Löwy (1994,
p. 9) destaca que, em sua obra, “Fleck enfatiza as origens sociais do conceito de
doença e sua divergência sincrônica (em culturas diferentes) e diacrônica (em
períodos históricos diferentes)”. Assim, o entendimento a respeito de um conceito
é, de certa forma, reflexo de um conjunto de crenças e costumes de uma
determinada época.
Para Fleck (2010) essa construção não ocorre de maneira acumulativa e linear,
mas sim por meio de continuidades e descontinuidades, assim, nem sempre o